João Pedro dos Santos Silva venceu o maior prêmio do Prix de Lausanne e terá uma bolsa de estudos de um ano em uma das cinco melhores escolas de balé do mundo
O bailarino João Pedro dos Santos Silva conquistou o 1º lugar no Prix de Lausanne, competição considerada o “Oscar” do balé mundial, que ocorre anualmente na cidade de Lausanne, na Suíça. A final ocorreu no dia 3 de fevereiro. Com apenas 15 anos, João Pedro é aluno da Escola do Futuro de Goiás em Artes Basileu França, e foi o único brasileiro na final da competição.
Ele também foi o mais votado pelo público entre os 20 candidatos finalistas, de 12 países diferentes, levando o Prêmio Melhor do Público. A premiação foi realizada na noite deste domingo (4), quando foram anunciadas as renomadas escolas do mundo que ofereceram bolsas de estudo para os vencedores do Prix de Lausanne, e João Pedro poderá escolher uma delas. Ele deve fazer aulas em algumas delas, como o Royal Ballet, em Londres, e a Ópera Nacional de Paris, antes de definir por uma.
“Eu ainda não consigo acreditar que é real, porque sonhei chegar aqui um dia, desde que era criança, e esse dia chegou. Quero agradecer a todos que me apoiaram. Meus professores, minha família e o Governo de Goiás, por proporcionar o que tive nessa viagem. Estou muito feliz!”, declarou o bailarino quando o resultado foi anunciado.
Para a coordenadora de Dança do Basileu França, Simone Malta, este prêmio é o reconhecimento da dedicação e do talento de João Pedro. “Para chegar onde está agora, foram necessários muitos sacrifícios, muitas horas de treinamento. Ele teve que se abster de muita coisa e sempre cumpriu tudo rigorosamente em busca de seu sonho. Estamos felizes e gratos pelo investimento do Governo de Goiás para que o Basileu França possa mostrar a sua arte nos palcos do mundo”, relata.
Paulista, João Pedro iniciou seus estudos na Escola do Futuro em Artes de Goiás Basileu França em 2020, com o objetivo de se tornar um bailarino profissional. Ele foi indicado por uma ex-professora na cidade do interior paulista de Matão. Referência nacional, a escola goiana recebe estudantes de vários estados brasileiros e também de outros países. Atualmente, dos 120 bailarinos que estudam no corpo de baile do Basileu, 40 vieram de outros estados, como São Paulo, Minas Gerais, Paraná, Mato Grosso, Piauí e Paraíba. Quatro são da Argentina.
Desde que chegou ao Basileu França, João Pedro tem arrebatado alguns dos principais prêmios de balé. Ainda naquele ano, o jovem conquistou a medalha de ouro na categoria infantil no Festival de Joinville. Em 2021, conquistou a medalha de ouro na categoria júnior no Youth America Grand Prix (YAGP), que ocorre anualmente em Nova York; em 2022, ficou com o segundo lugar na Categoria Júnior do mesmo festival.
No 3º Festival de Dança de Porto Alegre, ocorrido em junho de 2023, João foi eleito um dos dois melhores bailarinos do concurso – o outro foi Marcus Rufino, que também é aluno do Basileu França. No Festival de Dança de Joinville, considerado o maior festival de balé do mundo, realizado no ano passado, ele ganhou o Prêmio Especial Daniel Camargo, tendo ficado em primeiro lugar na Variação Masculina Júnior, em primeiro lugar no Pas de Deux Júnior (com Antonia Manrique, também aluna do Basileu França) e em primeiro lugar no Solo Neoclássico masculino Júnior. Além disso, foi o vencedor da pré-seletiva do Prix de Lausanne na América Latina, ocorrida em Córdoba, Argentina, no ano passado.
Este é o 16º prêmio internacional de balé dos estudantes da rede pública estadual de ensino profissionalizante de Goiás, desde 2013. Naquele ano ocorreu a primeira participação de bailarinos da EFG Basileu França, quando Adhonay Soares foi o grande vencedor, e, desde então, a escola tem tido bailarinos premiados em todas as edições. Na edição do ano passado do Prix de Lausanne, a bailarina goiana Ana Luísa Negrão levou o prêmio na categoria de Melhor Dança Contemporânea e também uma das nove becas, sendo a única brasileira premiada. Fora este, estudantes da Escola do Futuro Basileu França levaram dois prêmios no Youth America Grand Prix (YAGP), realizado nos Estados Unidos, em abril do ano passado; e 12 prêmios no Festival de Dança de Joinville, considerado o maior do mundo, em julho.
“O governo de Goiás investiu mais de R$ 50 milhões no Basileu França, escola pública estadual de artes, no ano passado. Os prêmios são resultado desse investimento e da dedicação e qualidade de nossos professores e alunos. Estamos muito orgulhosos do João Pedro, que foi à Suíça mostrar ao mundo a capacidade dos goianos e dos brasileiros”, afirma o secretário estadual de Ciência, Tecnologia e Inovação, José Frederico Lyra Netto.
Paixão e persistência
Nascido em Matão, São Paulo, em novembro de 2008, João Pedro decidiu muito cedo o que queria fazer da vida. Ainda na primeira infância declarou a seu pai que seu sonho era ser bailarino, fato que o pai, Evandro dos Santos Silva, já havia comprovado nos rodopios que o filho vivia a dar pela casa.
Quem conta essa história é a primeira professora de balé de JP, Renata Canova Ramos, na casa de quem Evandro trabalhou como azulejista. “Quando iniciou o trabalho, o pai dele falou: ‘Eu fiquei sabendo que você é professora de balé, eu tenho um filho que não para de rodar em casa e ele fala que quer ser bailarino’. Eu falei: ‘Nossa, qual a idade dele?’ Ele falou: ‘oito anos’. Assim como eu faço com todas as outras pessoas que falam que tem alguém, eu falei: ‘Leva ele lá na escola’. E ele levou, no dia seguinte. E aí o João Pedro, a gente percebia, assim, um jeitinho, uma cabecinha rápida e conversando com ele ainda na recepção ele me falou que tinha o sonho de dançar nos palcos internacionais. E eu: ‘Ah é? Que legal! Então vamos lá, vamos realizar esse sonho, né?’ Mas eu nem imaginava...”
Mas assim que iniciou a aula, Renata diz que viu que ele tinha algo especial. “Algo artístico muito grande e um posicionamento, assim, sabe, para um menino da idade dele, era algo muito maduro”, pontua. Como ele chegou no final de 2017, faltava um mês para o espetáculo e final de ano, porém, mesmo com poucas aulas, Renata o colocou para dançar com as demais alunas. “Ele se apresentou lindamente, mas sem muito trabalho, nenhum trabalho, na verdade. Foi mais uma coisa mesmo para ele já sentir como era, já que ele dizia que o sonho dele era dançar.”
Após alguns meses de aulas em 2018, João comentou com Renata que gostaria de ir para o Youth America Grand Prix (YAGP, prêmio de Dança que acontece anualmente em Nova Yorque ). “Aí eu falei: ‘João, isso daí a gente precisa fazer um trabalho mais focado, e você está começando agora, acho importante a gente pensar, porque a gente também não pode ficar se expondo, é algo muito sério, eu também não quero que você se frustre’”. Ele: “Não, tia, mas é o meu sonho, eu quero ir”.
A confiança e a dedicação foram tamanhas que a professora também acreditou e começou a fazer um trabalho focado nisso. “Começamos a estudar variações, e a variação que a gente sempre estudava era a do Adhonay*, que, assim, parece que é Deus que vai encaminhando tudo, parece não, certeza que é Deus, e aí ele olhava a variação, e ele falava assim: ‘Tia, um dia eu quero estar nesse palco, e vai aparecer aqui, ó, o meu nome. João Pedro dos Santos Silva, Brasil, e eu vou dançar nesse palco”. (*Adhonay Soares é um bailarino goiano que começou seus estudos no Gustav Ritter, terminando sua profissionalização na Escola do Futuro Basileu França e foi o ganhador do Prix de Lausanne em 2013).
Assim, com 9 anos, João Pedro foi inscrito na categoria infantil do YAGP e foi aprovado. “O João Pedro é um menino muito simpático. Ele conquistou, fez amizade com um monte de gente. E a Andréia Delgado, uma querida, o conheceu no YAGP Brasil. Na verdade, o Guivaldi estava dando aula na sala para o João Pedro e chamou a Andréia. E falou, Andréia, dá uma olhada nesse menino, a Simone precisa conhecer esse menino. Aí a Andréia chegou nele e perguntou o nome dele e quem era a professora. E o João Pedro saiu gritando pelos corredores: “Tia Renata, tia Renata, vem aqui, eu preciso te apresentar uma pessoa. Aí ele me levou até a Andréia, e a Andréia perguntou rapidamente, falou dele, já ofereceu os figurinos para ele... A gente fala que ela foi a fada madrinha dele”.
Renata e João Pedro conheceram Simone Malta, que também se encantou com o bailarino iniciante. João Pedro foi selecionado a etapa final do YAGP em Nova Yorque, mas a pandemia, em 2020, impediu a viagem. João Pedro continuou as aulas com Renata, mas ela diz que, em um determinado momento, se deu conta de que ele precisava avançar. Para isso, sua opção era a Escola do Futuro de Goiás em Artes Basileu França e Simone Malta. A coordenadora de Dança havia entrado em contato com Renata, sugerindo que ele se inscrevesse em processo seletivo da instituição e dizendo que aceitaria receber o jovem bailarino em sua própria casa.
“O João Pedro estava muito inseguro, porque era uma criança, e ele dizia: ‘Tia, eu tenho medo, como vai ser?’ ‘Deixa a tia te falar uma coisa, você tem um sonho, você é um menino muito talentoso, um menino que tem muita vontade. A gente, enquanto escola, nós não poderemos fazer muita coisa por você. Lá, a tia Simone tem toda uma estrutura, excelentes profissionais. Lembra do Adhonay, que você tanto assistia? veja o nível dele, então você pode chegar num nível assim, muito mais rápido do que aqui em Matão.’ Enfim, fui falando e ele foi se fortalecendo, planejamos tudo e ele foi”. Veio para a EFG Basileu França, onde começou a ganhar prêmios, e neste ano, aos 15 anos, é o principal ganhador do principal prêmio de balé mundial.